quinta-feira, 31 de maio de 2012

As multidões - Charles Baudelaire

AS MULTIDÕES

XII

Não é dado a todo o mundo tomar um banho de multidão: gozar da presença das massas populares é uma arte. E somente ele pode fazer, às expensas do gênero humano, uma festa de vitalidade, a quem urna fada insuflou em seu berço o gosto da fantasia e da máscara, o ódio ao domicílio e a paixão por viagens.
Multidão, solidão: termos iguais e conversíveis pelo poeta ativo e fecundo. Quem não sabe povoar sua solidão também não sabe estar só no meio de uma multidão ocupadíssima.
O poeta goza desse incomparável privilégio que é o de ser ele mesmo e um outro. Como essas almas errantes que procuram um corpo, ele entra, quando quer, no personagem de qualquer um. Só para ele tudo está vago; e se certos lugares lhe parecem fechados é que, a seu ver, não valem a pena ser visitados.
O passeador solitário e pensativo goza de uma singular embriaguez desta comunhão universal. Aquele que desposa a massa conhece os prazeres febris dos quais serão eternamente privados o egoísta, fechado como um cofre, e o preguiçoso. ensimesmado como um molusco. Ele adota como suas todas as profissões, todas as alegrias, todas as misérias que as circunstâncias lhe apresentem.
Isto que os homens denominam amor é bem pequeno, bem restrito, bem frágil comparado a esta inefável orgia, a esta solta prostituição da alma que se dá inteiramente, poesia e caridade, ao imprevisto que se apresenta, ao desconhecido que passa.
É bom ensinar, às vezes, aos felizes deste mundo, pelo menos para humilhar um instante o seu orgulho, que existem bondades superiores às deles, maiores e mais refinadas, Os fundadores de colônias, os pastores de povos, os sacerdotes missionários exilados no fim do mundo conhecem, sem dúvida, alguma coisa dessas misteriosas bebedeiras; e, no seio da vasta família que seu gênio criou, eles devem rir, algumas vezes, dos que se queixam de suas fortunas tão agitadas e de suas vidas tão castas.

BAUDELAIRE, Charles. As multidões. In: Pequenos poemas em prosa. Ed. Nova Fronteira: Rio de Janeiro, 1976.,



quarta-feira, 30 de maio de 2012

Levantados do Chão - Exposição José Saramago


Esta mostra, composta por vários textos e imagens, homenageia o Nobel de Literatura José Saramago e uma das suas grandes obras, Levantados do Chão, editada em 1980.


   

Publicado em 1980 Levantado do Chão, considerado pela crítica como um dos romances fundamentais de José Saramago, é fruto da convivência de alguns meses com os trabalhadores da União Cooperativa de Produção Boa Esperança, quando o escritor se mudou para o Lavre e Montemor-O-Novo. Viajando, ao longo da obra, como narrador, o autor acompanha a vida de dor e sofrimento de três gerações: Domingos Mau-Tempo, o seu filho João e os netos António e Gracinda, casada com António Espada. Eles representam o povo do Alentejo. Um povo que luta contra as forças opressoras (os latifundiários, as forças da ordem e a Igreja). É uma luta obstinada e de muitos sacrifícios, num ambiente de miséria rural. É uma fotografia do movimento anti-fascista no Alentejo.
Levantados do Chão percorre uma zona do Alentejo caracterizada pelo latifúndio, desde o final do século XIX até ao período pós-25 de abril. Sobre este livro, disse Saramago:

 “Um escritor é um homem como os outros: sonha. E o meu sonho foi o de poder dizer deste livro, quando terminasse: ‘Isto é um livro sobre o Alentejo.’ Um livro, um simples romance, gentes, conflitos, alguns amores, muitos sacrifícios e grandes fomes, as vitórias e os desastres, a aprendizagem da transformação, e mortes. É portanto um livro que quis aproximar-se da vida, e essa seria a sua mais merecida explicação.”


«O que mais há na terra é paisagem», diz José Saramago a abrir Levantado do Chão.



Paisagem, gentes e os caminhos que as pessoas, sejam reais sejam literárias, construíram para tornar mais humanas as suas vidas.



Fonte: Fundação José Saramago.



terça-feira, 29 de maio de 2012

Eugène Delacroix - A Liberdade Guiando O Povo - PALETAS

       


Ferdinand Victor Eugène Delacroix (26 de abril de 1798 - 13 Agosto 1863) foi um francês romântico artista considerado desde o início de sua carreira como líder da escola romântico francês. Uso de Delacroix de pinceladas expressivas e seu estudo dos efeitos ópticos de colorir profundamente a obra do impressionista , enquanto sua paixão pelo exótico inspirou os artistas do simbolista movimento. Uma multa litógrafo , Delacroix ilustrado várias obras de William Shakespeare , o escritor escocês Walter Scott eo escritor alemão Johann Wolfgang von Goethe.
Em contraste com o neoclássico perfeccionismo de seus principais rivais Ingres , Delacroix levou para sua inspiração a arte de Rubens e pintores da veneziana do Renascimento , com ênfase atendente em cor e movimento ao invés de clareza do contorno e forma cuidadosamente modelados.Conteúdo dramático e romântico caracteriza os temas centrais de sua maturidade, e levou-o não para os modelos clássicos da arte grega e romana, mas viajar no Norte da África, em busca do exótico. Amigo e herdeiro espiritual de Théodore Géricault , Delacroix também foi inspirado por Lord Byron, com quem compartilhou uma forte identificação com as "forças do sublime", da natureza em ação muitas vezes violenta. 
No entanto, Delacroix foi dado nem ao sentimentalismo nem pompa, e seu romantismo era a de um individualista. Nas palavras de Baudelaire , "Delacroix era apaixonadamente apaixonado pela paixão, mas friamente determinado a expressar paixão tão claramente quanto possível".

 Liberdade Guiando o Povo

Mais influente obra de Delacroix veio em 1830 com a pintura Liberdade Guiando o Povo , que para a escolha do tema e técnica destaca as diferenças entre a abordagem romântica e do estilo neoclássico. Menos obviamente, também é diferente do romantismo de Géricault e da Jangada da Medusa .
"Delacroix sentiu sua composição mais vividamente como um todo, o pensamento de suas figuras e multidões como tipos, e dominou-los pela figura simbólica da liberdade republicana, que é um dos melhores suas invenções de plástico ..."
Provavelmente o melhor pintura de Delacroix conhecida, é uma imagem inesquecível de parisienses, depois de ter pegado em armas, marchando para a frente sob a bandeira do tricolor que representa a liberdade, igualdade e fraternidade; Delacroix foi inspirado por eventos contemporâneos de invocar a imagem romântica do espírito de liberdade. Os soldados deitados mortos em primeiro plano oferecer contraponto triste com a figura simbólica do sexo feminino, que está iluminado, triunfante, como se estivesse em um holofote.
O governo francês comprou a pintura, mas funcionários considerada sua glorificação da liberdade também inflamatória e removido da vista do público. No entanto, Delacroix ainda recebeu comissões do governo para muitos murais e pinturas do teto. Ele parece ter tentado representar o espírito e o caráter do povo, em vez de glorificar o evento em si, uma revolução contra o rei Carlos X, que fez pouco mais do que trazer um rei diferente, Lois Philippe, ao poder .
Após a Revolução de 1848 que viu o fim do reinado de Louis Philippe, pintura de Delacroix ", A Liberdade Guiando o Povo , foi finalmente colocado em exibição pelo presidente recém-eleito, Luís Napoleão ( Napoleão III ). Hoje, é visível em o Louvre museu.
O menino segurando uma arma em cima da direita é, por vezes, pensado para ser uma inspiração do Gavroche personagem de Victor Hugo's romance de 1862, Les Misérables.



"Delacroix amava tudo, sabia pintar tudo, e sabia apreciar todos os gêneros de talentos. Era o espírito mais aberto a todas as noções e a todas as impressões, o fruidor mais eclético e mais imparcial."
(Charles Baudelaire)



Fonte: Wikipédia e "Escritos sobre arte" - Charles Baudelaire




Conto: A Igreja do Diabo - Machado de Assis


Machado de Assis

CAPITULO I - DE UMA IDÉIA MIRÍFICA

Conta um velho manuscrito beneditino que o Diabo, em certo dia, teve a idéia de fundar uma igreja. Embora os seus lucros fossem contínuos e grandes, sentia-se humilhado com o papel avulso que exercia desde séculos, sem organização, sem regras, sem cânones, sem ritual, sem nada. Vivia, por assim dizer, dos remanescentes divinos, dos descuidos e obséquios humanos. Nada fixo, nada regular. Por que não teria ele a sua igreja? Uma igreja do Diabo era o meio eficaz de combater as outras religiões, e destruí-las de uma vez.
- Vá, pois, uma igreja, concluiu ele. Escritura contra Escritura, breviário contra breviário. Terei a minha missa, com vinho e pão à farta, as minhas prédicas, bulas, novenas e todo o demais aparelho eclesiástico. O meu credo será o núcleo universal dos espíritos, a minha igreja uma tenda de Abraão. E depois, enquanto as outras religiões se combatem e se dividem, a minha igreja será única; não acharei diante de mim, nem Maomé, nem Lutero. Há muitos modos de afirmar; há só um de negar tudo.
Dizendo isto, o Diabo sacudiu a cabeça e estendeu os braços, com um gesto magnífico e varonil. Em seguida, lembrou-se de ir ter com Deus para comunicar-lhe a idéia, e desafiá-lo; levantou os olhos, acesos de ódio, ásperos de vingança, e disse consigo:
- Vamos, é tempo. E rápido, batendo as asas, com tal estrondo que abalou todas as províncias do abismo, arrancou da sombra para o infinito azul.

CAPITULO II
ENTRE DEUS E O DIABO

Deus recolhia um ancião, quando o Diabo chegou ao céu. Os serafins que engrinaldavam o recém-chegado, detiveram-no logo, e o Diabo deixou-se estar à entrada com os olhos no Senhor.
- Que me queres tu? perguntou este.
- Não venho pelo vosso servo Fausto, respondeu o Diabo rindo, mas por todos os Faustos do século e dos séculos.
- Explica-te.
- Senhor, a explicação é fácil; mas permiti que vos diga: recolhei primeiro esse bom velho; dai-lhe o melhor lugar, mandai que as mais afinadas cítaras e alaúdes o recebam com os mais divinos coros...
- Sabes o que ele fez? perguntou o Senhor, com os olhos cheios de doçura.
- Não, mas provavelmente é dos últimos que virão ter convosco. Não tarda muito que o céu fique semelhante a uma casa vazia, por causa do preço, que é alto. Vou edificar uma hospedaria barata; em duas palavras, vou fundar uma igreja. Estou cansado da minha desorganização, do meu reinado casual e adventício. É tempo de obter a vitória final e completa. E então vim dizer-vos isto, com lealdade, para que me não acuseis de dissimulação... Boa idéia, não vos parece?
- Vieste dizê-la, não legitimá-la, advertiu o Senhor,
- Tendes razão, acudiu o Diabo; mas o amor-próprio gosta de ouvir o aplauso dos mestres. Verdade é que neste caso seria o aplauso de um mestre vencido, e uma tal exigência... Senhor, desço à terra; vou lançar a minha pedra fundamental.
- Vai
- Quereis que venha anunciar-vos o remate da obra?
- Não é preciso; basta que me digas desde já por que motivo, cansado há tanto da tua desorganização, só agora pensaste em fundar uma igreja?
O Diabo sorriu com certo ar de escárnio e triunfo. Tinha alguma idéia cruel no espírito, algum reparo picante no alforje da memória, qualquer coisa que, nesse breve instante da eternidade, o fazia crer superior ao próprio Deus. Mas recolheu o riso, e disse:
- Só agora concluí uma observação, começada desde alguns séculos, e é que as virtudes, filhas do céu, são em grande número comparáveis a rainhas, cujo manto de veludo rematasse em franjas de algodão. Ora, eu proponho-me a puxá-las por essa franja, e trazê- las todas para minha igreja; atrás delas virão as de seda pura...
- Velho retórico! murmurou o Senhor.
- Olhai bem. Muitos corpos que ajoelham aos vossos pés, nos templos do mundo, trazem as anquinhas da sala e da rua, os rostos tingem-se do mesmo pó, os lenços cheiram aos mesmos cheiros, as pupilas centelham de curiosidade e devoção entre o livro santo e o bigode do pecado. Vede o ardor, - a indiferença, ao menos, - com que esse cavalheiro põe em letras públicas os benefícios que liberalmente espalha, - ou sejam roupas ou botas, ou moedas, ou quaisquer dessas matérias necessárias à vida... Mas não quero parecer que me detenho em coisas miúdas; não falo, por exemplo, da placidez com que este juiz de irmandade, nas procissões, carrega piedosamente ao peito o vosso amor e uma comenda... Vou a negócios mais altos...
Nisto os serafins agitaram as asas pesadas de fastio e sono. Miguel e Gabriel fitaram no Senhor um olhar de súplica, Deus interrompeu o Diabo.
- Tu és vulgar, que é o pior que pode acontecer a um espírito da tua espécie, replicou-lhe o Senhor. Tudo o que dizes ou digas está dito e redito pelos moralistas do mundo. É assunto gasto; e se não tens força, nem originalidade para renovar um assunto gasto, melhor é que te cales e te retires. Olha; todas as minhas legiões mostram no rosto os sinais vivos do tédio que lhes dás. Esse mesmo ancião parece enjoado; e sabes tu o que ele fez?
- Já vos disse que não.
- Depois de uma vida honesta, teve uma morte sublime. Colhido em um naufrágio, ia salvar-se numa tábua; mas viu um casal de noivos, na flor da vida, que se debatiam já com a morte; deu-lhes a tábua de salvação e mergulhou na eternidade. Nenhum público: a água e o céu por cima. Onde achas aí a franja de algodão?
- Senhor, eu sou, como sabeis, o espírito que nega.
- Negas esta morte?
- Nego tudo. A misantropia pode tomar aspecto de caridade; deixar a vida aos outros, para um misantropo, é realmente aborrecê-los...
- Retórico e sutil! exclamou o Senhor. Vai; vai, funda a tua igreja; chama todas as virtudes, recolhe todas as franjas, convoca todos os homens... Mas, vai! vai!
Debalde o Diabo tentou proferir alguma coisa mais. Deus impusera-lhe silêncio; os serafins, a um sinal divino, encheram o céu com as harmonias de seus cânticos. O Diabo sentiu, de repente, que se achava no ar; dobrou as asas, e, como um raio, caiu na terra.

CAPITULO III
A BOA NOVA AOS HOMENS

Uma vez na terra, o Diabo não perdeu um minuto. Deu-se pressa em enfiar a cogula beneditina, como hábito de boa fama, e entrou a espalhar uma doutrina nova e extraordinária, com uma voz que reboava nas entranhas do século. Ele prometia aos seus discípulos e fiéis as delícias da terra, todas as glórias, os deleites mais íntimos. Confessava que era o Diabo; mas confessava-o para retificar a noção que os homens tinham dele e desmentir as histórias que a seu respeito contavam as velhas beatas.
- Sim, sou o Diabo, repetia ele; não o Diabo das noites sulfúreas, dos contos soníferos, terror das crianças, mas o Diabo verdadeiro e único, o próprio gênio da natureza, a que se deu aquele nome para arredá-lo do coração dos homens. Vede-me gentil a airoso. Sou o vosso verdadeiro pai. Vamos lá: tomai daquele nome, inventado para meu desdouro, fazei dele um troféu e um lábaro, e eu vos darei tudo, tudo, tudo, tudo, tudo, tudo...
Era assim que falava, a princípio, para excitar o entusiasmo, espertar os indiferentes, congregar, em suma, as multidões ao pé de si. E elas vieram; e logo que vieram, o Diabo passou a definir a doutrina. A doutrina era a que podia ser na boca de um espírito de negação. Isso quanto à substância, porque, acerca da forma, era umas vezes sutil, outras cínica e deslavada.
Clamava ele que as virtudes aceitas deviam ser substituídas por outras, que eram as naturais e legítimas. A soberba, a luxúria, a preguiça foram reabilitadas, e assim também a avareza, que declarou não ser mais do que a mãe da economia, com a diferença que a mãe era robusta, e a filha uma esgalgada. A ira tinha a melhor defesa na existência de Homero; sem o furor de Aquiles, não haveria a Ilíada: "Musa, canta a cólera de Aquiles, filho de Peleu"... O mesmo disse da gula, que produziu as melhores páginas de Rabelais, e muitos bons versos do Hissope; virtude tão superior, que ninguém se lembra das batalhas de Luculo, mas das suas ceias; foi a gula que realmente o fez imortal. Mas, ainda pondo de lado essas razões de ordem literária ou histórica, para só mostrar o valor intrínseco daquela virtude, quem negaria que era muito melhor sentir na boca e no ventre os bons manjares, em grande cópia, do que os maus bocados, ou a saliva do jejum? Pela sua parte o Diabo prometia substituir a vinha do Senhor, expressão metafórica, pela vinha do Diabo, locução direta e verdadeira, pois não faltaria nunca aos seus com o fruto das mais belas cepas do mundo. Quanto à inveja, pregou friamente que era a virtude principal, origem de prosperidades infinitas; virtude preciosa, que chegava a suprir todas as outras, e ao próprio talento.
As turbas corriam atrás dele entusiasmadas. O Diabo incutia-lhes, a grandes golpes de eloqüência, toda a nova ordem de coisas, trocando a noção delas, fazendo amar as perversas e detestar as sãs.
Nada mais curioso, por exemplo, do que a definição que ele dava da fraude. Chamava-lhe o braço esquerdo do homem; o braço direito era a força; e concluía: muitos homens são canhotos, eis tudo. Ora, ele não exigia que todos fossem canhotos; não era exclusivista. Que uns fossem canhotos, outros destros; aceitava a todos, menos os que não fossem nada. A demonstração, porém, mais rigorosa e profunda, foi a da venalidade. Um casuísta do tempo chegou a confessar que era um monumento de lógica. A venalidade, disse o Diabo, era o exercício de um direito superior a todos os direitos. Se tu podes vender a tua casa, o teu boi, o teu sapato, o teu chapéu, coisas que são tuas por uma razão jurídica e legal, mas que, em todo caso, estão fora de ti, como é que não podes vender a tua opinião, o teu voto, a tua palavra, a tua fé, coisas que são mais do que tuas, porque são a tua própria consciência, isto é, tu mesmo? Negá-lo é cair no obscuro e no contraditório. Pois não há mulheres que vendem os cabelos? não pode um homem vender uma parte do seu sangue para transfundi-lo a outro homem anêmico? e o sangue e os cabelos, partes físicas, terão um privilégio que se nega ao caráter, à porção moral do homem? Demonstrando assim o princípio, o Diabo não se demorou em expor as vantagens de ordem temporal ou pecuniária; depois, mostrou ainda que, à vista do preconceito social, conviria dissimular o exercício de um direito tão legítimo, o que era exercer ao mesmo tempo a venalidade e a hipocrisia, isto é, merecer duplicadamente. E descia, e subia, examinava tudo, retificava tudo. Está claro que combateu o perdão das injúrias e outras máximas de brandura e cordialidade. Não proibiu formalmente a calúnia gratuita, mas induziu a exercê-la mediante retribuição, ou pecuniária, ou de outra espécie; nos casos, porém, em que ela fosse uma expansão imperiosa da força imaginativa, e nada mais, proibia receber nenhum salário, pois equivalia a fazer pagar a transpiração. Todas as formas de respeito foram condenadas por ele, como elementos possíveis de um certo decoro social e pessoal; salva, todavia, a única exceção do interesse. Mas essa mesma exceção foi logo eliminada, pela consideração de que o interesse, convertendo o respeito em simples adulação, era este o sentimento aplicado e não aquele.
Para rematar a obra, entendeu o Diabo que lhe cumpria cortar por toda a solidariedade humana. Com efeito, o amor do próximo era um obstáculo grave à nova instituição. Ele mostrou que essa regra era uma simples invenção de parasitas e negociantes insolváveis; não se devia dar ao próximo senão indiferença; em alguns casos, ódio ou desprezo. Chegou mesmo à demonstração de que a noção de próximo era errada, e citava esta frase de um padre de Nápoles, aquele fino e letrado Galiani, que escrevia a uma das marquesas do antigo regímen: "Leve a breca o próximo! Não há próximo!" A única hipótese em que ele permitia amar ao próximo era quando se tratasse de amar as damas alheias, porque essa espécie de amor tinha a particularidade de não ser outra coisa mais do que o amor do indivíduo a si mesmo. E como alguns discípulos achassem que uma tal explicação, por metafísica, escapava à compreensão das turbas, o Diabo recorreu a um apólogo: - Cem pessoas tomam ações de um banco, para as operações comuns; mas cada acionista não cuida realmente senão nos seus dividendos: é o que acontece aos adúlteros. Este apólogo foi incluído no livro da sabedoria.

CAPITULO IV
FRANJAS E FRANJAS

A previsão do Diabo verificou-se. Todas as virtudes cuja capa de veludo acabava em franja de algodão, uma vez puxadas pela franja, deitavam a capa às urtigas e vinham alistar-se na igreja nova. Atrás foram chegando as outras, e o tempo abençoou a instituição. A igreja fundara-se; a doutrina propagava-se; não havia uma região do globo que não a conhecesse, uma língua que não a traduzisse, uma raça que não a amasse. O Diabo alçou brados de triunfo.
Um dia, porém, longos anos depois, notou o Diabo que muitos dos seus fiéis, às escondidas, praticavam as antigas virtudes. Não as praticavam todas, nem integralmente, mas algumas, por partes, e, como digo, às ocultas. Certos glutões recolhiam-se a comer frugalmente três ou quatro vezes por ano, justamente em dias de preceito católico; muitos avaros davam esmolas, à noite, ou nas ruas mal povoadas; vários dilapidadores do erário restituíam-lhe pequenas quantias; os fraudulentos falavam, uma ou outra vez, com o coração nas mãos, mas com o mesmo rosto dissimulado, para fazer crer que estavam embaçando os outros.
A descoberta assombrou o Diabo. Meteu-se a conhecer mais diretamente o mal, e viu que lavrava muito. Alguns casos eram até incompreensíveis, como o de um droguista do Levante, que envenenara longamente uma geração inteira, e, com o produto das drogas socorria os filhos das vítimas. No Cairo achou um perfeito ladrão de camelos, que tapava a cara para ir às mesquitas. O Diabo deu com ele à entrada de uma, lançou-lhe em rosto o procedimento; ele negou, dizendo que ia ali roubar o camelo de um drogomano; roubou-o, com efeito, à vista do Diabo e foi dá-lo de presente a um muezim, que rezou por ele a Alá. O manuscrito beneditino cita muitas outra descobertas extraordinárias, entre elas esta, que desorientou completamente o Diabo. Um dos seus melhores apóstolos era um calabrês, varão de cinqüenta anos, insigne falsificador de documentos, que possuía uma bela casa na campanha romana, telas, estátuas, biblioteca, etc. Era a fraude em pessoa; chegava a meter-se na cama para não confessar que estava são. Pois esse homem, não só não furtava ao jogo, como ainda dava gratificações aos criados. Tendo angariado a amizade de um cônego, ia todas as semanas confessar-se com ele, numa capela solitária; e, conquanto não lhe desvendasse nenhuma das suas ações secretas, benzia-se duas vezes, ao ajoelhar-se, e ao levantar-se. O Diabo mal pôde crer tamanha aleivosia. Mas não havia duvidar; o caso era verdadeiro.
Não se deteve um instante. O pasmo não lhe deu tempo de refletir, comparar e concluir do espetáculo presente alguma coisa análoga ao passado. Voou de novo ao céu, trêmulo de raiva, ansioso de conhecer a causa secreta de tão singular fenômeno. Deus ouviu-o com infinita complacência; não o interrompeu, não o repreendeu, não triunfou, sequer, daquela agonia satânica. Pôs os olhos nele, e disse:
- Que queres tu, meu pobre Diabo? As capas de algodão têm agora franjas de seda, como as de veludo tiveram franjas de algodão. Que queres tu? É a eterna contradição humana.


Fonte: Contos Consagrados de Machado de Assis, "A Igreja do Diabo" (1870). 






segunda-feira, 21 de maio de 2012

Charles Chaplin em O Garoto 1921 Filme Completo

        

O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos.

A cobiça envenenou a alma dos homens... levantou no mundo as muralhas do ódios... e tem-nos feito marchar a passo de ganso para a miséria e morticínios.
Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina, que produz abundância, tem-nos deixado em penúria.

Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco.

Mais do que de máquinas, precisamos de humanidade. Mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido.

(Charles Chaplin)‏


Caravaggio - Anjos e Carrascos - Completo

domingo, 20 de maio de 2012

LivroClip de Dom Casmurro, de Machado de Assis



CAPÍTULO XXXII / OLHOS DE RESSACA

Tudo era matéria às curiosidades de Capitu. Caso houve, porém, no qual não sei se aprendeu ou ensinou, ou se fez ambas as cousas, como eu. É o que contarei no outro Capítulo. Neste direi somente que, passados alguns dias do ajuste com o agregado, fui ver a minha amiga; eram dez horas da manhã. D. Fortunata, que estava no quintal nem esperou que eu lhe perguntasse pela filha.
--Está na sala penteando o cabelo, disse-me; vá devagarzinho para lhe pregar um susto.
Fui devagar, mas ou o pé ou o espelho traiu-me. Este pode ser que não fosse; era um espelhinho de pataca (perdoai a barateza), comprado a um mascate italiano, moldura tosca, argolinha de latão, pendente da parede, entre as duas janelas. Se não foi ele, foi o pé. Um ou outro, a verdade é que, apenas entrei na sala, pente, cabelos, toda ela voou pelos ares, e só lhe ouvi esta pergunta:
--Há alguma cousa?
--Não há nada, respondi; vim ver você antes que o Padre Cabral chegue para a lição. Como passou a noite?
--Eu bem. José Dias ainda não falou?
--Parece que não.
-- Mas então quando fala?
--Disse-me que hoje ou amanhã pretende tocar no assunto; não vai logo de pancada, falará assim por alto e por longe, um toque. Depois, entrará em matéria. Quer primeiro ver se mamãe tem a resolução feita...
-- Que tem, tem, interrompeu Capitu. E se não fosse preciso alguém para vencer já, e de todo, não se lhe falaria. Eu já nem sei se José Dias poderá influir tanto; acho que fará tudo, se sentir que você realmente não quer ser padre, mas poderá alcançar?... Ele é atendido; se, porém... É um inferno isto! Você teime com ele, Bentinho.
--Teimo- hoje mesmo ele há de falar.
--Você jura?
--Juro. Deixe ver os olhos, Capitu.
Tinha-me lembrado a definição que José Dias dera deles, "olhos de cigana oblíqua e dissimulada." Eu não sabia o que era obliqua, mas dissimulada sabia, e queria ver se podiam chamar assim. Capitu deixou-se fitar e examinar. Só me perguntava o que era, se nunca os vira, eu nada achei extraordinário; a cor e a doçura eram minhas conhecidas. A demora da contemplação creio que lhe deu outra idéia do meu intento; imaginou que era um pretexto para mirá-los mais de perto, com os meus olhos longos, constantes, enfiados neles, e a isto atribuo que entrassem a ficar crescidos, crescidos e sombrios, com tal expressão que...
Retórica dos namorados, dá-me uma comparação exata e poética para dizer o que foram aqueles olhos de Capitu. Não me acode imagem capaz de dizer, sem quebra da dignidade do estilo, o que eles foram e me fizeram. Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá idéia daquela feição nova. Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca. Para não ser arrastado, agarrei-me às outras partes vizinhas, às orelhas, aos braços, aos cabelos espalhados pelos ombros, mas tão depressa buscava as pupilas, a onda que saía delas vinha crescendo, cava e escura, ameaçando envolver-me, puxar-me e tragar-me. Quantos minutos gastamos naquele jogo? Só os relógios do céu terão marcado esse tempo infinito e breve. A eternidade tem as suas pêndulas; nem por não acabar nunca deixa de querer saber a duração das felicidades e dos suplícios. Há de dobrar o gozo aos bem-aventurados do céu conhecer a soma dos tormentos que já terão padecido no inferno os seus inimigos; assim também a quantidade das delícias que terão gozado no céu os seus desafetos aumentará as dores aos condenados do inferno. Este outro suplício escapou ao divino Dane; mas eu não estou aqui para emendar poetas. Estou para contar que, ao cabo de um tempo não marcado, agarrei-me definitivamente aos cabelos de Capitou, mas então com as mãos, e disse-lhe,--para dizer alguma cousa,--que era capaz de os pentear, se quisesse.
--Você?
--Eu mesmo.
--Vai embaraçar-me o cabelo todo, isso sim.
--Se embaraçar, você desembaraça depois.
--Vamos ver.

Charles Baudelaire par Saez

   

MULHERES MALDITAS - DELFINA E HIPÓLITA

CHARLES BAUDELAIRE

À tíbia das lamparinas voluptuosas,
Sobre sensuais coxins impregnados de essência,
Sonhava Hipólita as carícias poderosas
Que lhe erguiam o véu da púbere inocência.

Ela buscava, o olhar na tempestade posto,
De sua ingenuidade o céu distante agora,
Como um viajante para trás volve o seu rosto
Em busca da manhã que já se foi embora.

Os olhos já sem viço, o preguiçoso pranto,
O ar exausto, o estupor, lúbrica moleza.
Os barcos sem ação, como armas vãs a um canto,
Tudo afinal lhe ungia a tímida beleza.

Posta a seus pés, serena e cheia de alegria,
Delfina lhe lançava à carne olhos ardentes,
Como o animal feroz que a vítima vigia,
Após havê-la antes marcado com seus dentes.

Bela e viril de joelhos ante a frágil bela,
Soberba, ela sorvia com volúpia intensa
O vinho da vitória e, acercando-se dela,
Punha-se à espera de uma doce recompensa.

No pasmo olhar da presa ela buscava aflita
Ouvir o canto que o prazer sem voz entoa,
E essa sublime gratidão que arde infinita
E, qual suspiro, sob as pálpebras escoa.

- "Hipólita, amor meu, que me dizes então?
Compreendes quão pueril é oferecer agora
Em holocausto as tuas rosas em botão
A um sopro que as pudesse espedaçar lá fora?

Meus beijos são sutis como asas erradias
Que afagam pela tarde os lagos transparentes,
Mas os de teu amante hão de escavar estrias
Como as carroças e os arados inclemente;

Sobre ti passarão qual sobre alguém pisasse
Uma junta de bois os cascos sem piedade...
Hipólita, meu bem! Volve pois tua face,
Tu, coração, que és o meu todo e és a metade,

Volve teus olhos cheios de astros como os céus!
Dá-me esse olhar que é como um bálsamo bem-vindo;
Do prazer mais sombrio eu erguerei os véus
E hei de fazer-te adormecer num sonho infindo!"

Mas Hipólita então a fronte levantando:
- "Não sou ingrata e do que fiz não me arrependo,
Minha Delfina, eu sofro e à dor vou definhando,
Como após um festim crepuscular e horrendo.

Sinto pesarem em mim graves terrores
E negros batalhões de fantasmas dispersos,
Que querem conduzir-me a fluidos corredores
Num sangüíneo horizonte em toda parte imersos.

Teremos cometido algum pecado extremo?
Explica, se é capaz, o medo que me acua:
Se me dizes: Meu anjo! Eu de alto a baixo tremo
E sinto minha boca ir em busca da tua.

Não me olhes mais assim, ó tu, meu pensamento!
Tu que eu adoro e que és enfim minha eleição,
Mesmo que fosses um fantoche fraudulento
E a própria origem dessa estranha perdição!"

Delfina, a sacudir nervosa a crina ondeante,
E como a tripudiar sobre um tripé supremo,
O olhar fatal, gritou, despótica e arrogante:
- "E quem diante do amor ousa falar do inferno?

Maldito para sempre o sonhador inútil
Que por primeiro quis, em sua insanidade,
Enfrentando um problema insolúvel e fútil,
Às delicias do amor juntar a honestidade!

O que deseja unir, em místico projeto,
O dia com a noite, o frio com a flama,
Jamais aquecerá seu trôpego esqueleto
Àquele rubro sol que amor também se chama!

Vai, se queres, de um noivo estúpido à procura;
Abre teu peito em flor a seus beijos em fúria;
E como quem o horror ao remorso mistura,
No seio hás de exibir-me o estigma da luxúria...

Aqui somente a um mestre é licito servir-se!"
Mas Hipólita, em meio a uma enorme aflição,
De súbito gritou: - "Sinto em meu ser abrir-se
Um abismo, e este abismo é enfim meu coração!

Ardente qual vulcão, mais fundo que a tormenta,
Nada este monstro aplacará dentro de mim
E nunca há de saciar Eumênide sedenta
Que o queimará, archote em punho, até o fim.

Que os véus de nossa alcova ocultem-nos do mundo,
E que o cansaço dê repouso a tais agruras!
Quero extinguir-me no teu vórtice profundo
E no teu seio achar a paz das sepulturas!"

- Descei, descei, ó tristes vítimas sublimes,
Descei por onde o fogo arde em clarões eternos!
Mergulhai neste abismo em que todos os crimes,
Tangidos por um vento oriundo dos infernos,

Fervilham de mistura aos ásperos trovões.
Sombras dementes, ide ao fim de vosso vício;
Não poderei o ódio expulsar dos corações,
E é do prazer que há de surgir vosso suplício.

Jamais um raio há de clarear vossas cavernas;
Pelas fendas da pedra os miasmas delirantes
Infiltram-se a brilhar, assim como lanternas,
E os corpos vos penetram de odores nauseantes.

O acre prazer que vos alegra a erma existência
A sede vos aumenta e a vossa pela engelha;
E ao vento furibundo da concupiscência
Vossa carne se esgarça qual bandeira velha.

Longe dos vivos, erradias, condenadas,
Correi rumo ao deserto e ali uivai a sós;
Cumpri vosso destino, almas desordenadas,
E fugi o infinito que trazei em vós!




sábado, 19 de maio de 2012

Baudelaire et Tannhauser (Wagner) : Il me semblait que cette musique ét...

   

Tannhäuser und der Sängerkrieg aus Wartburg (Tannhäuser e o torneio de trovadores de Wartburg, em alemão) é uma ópera em três atos com a música de Richard Wagner, e com o libreto do próprio compositor. Estreou no ano de 1845 na cidade Dresden, na Alemanha.

Baseada numa lenda medieval, conta a história de Tannhäuser, um menestrel que se deixa seduzir por uma mulher mundana, de nome Vênus, contrariando assim a defesa do torneio dos trovadores a que ele pertence de que o amor deve ser sublime e elevado. Quando Tannhäuser defende deliberadamente o amor carnal de Vênus, é reprimido pelos trovadores e consolado apenas por Isabel, uma virgem que o ama muito. É-lhe dito que sua única chance de perdão é dirigir-se ao Vaticano e rogar o perdão do Papa.
Tannhäuser segue, então, com o torneio até Roma, mas de maneira auto-punitiva: dormindo sobre a neve, enquanto os demais estão no alojamento; caminhando descalço sobre o chão quente, passando fome, e ainda com os olhos vendados, para não ver as belas paisagens da Itália. Ao chegar diante do papa, em vez de obter o perdão, ouve o papa dizer que é mais fácil o cajado que ele segura florescer do que ele obter o perdão dos pecados, tanto no céu quanto na terra.
Odiando a igreja, Tannhäuser volta à Alemanha e Isabel sobe aos céus, rogando a Deus que interceda por ele. Os trovadores voltam com a notícia de que o cajado do papa floresceu, simbolizando que um pecador obteve no céu o perdão que não obteve na terra.


Fonte: Wikipédia





quarta-feira, 16 de maio de 2012

Os Caprichos de Goya.

Vicente López Portaña (1772 - 1850), "Retrato de Francisco de Goya" - 1826.












Francisco José de Goya y Lucientes (FuendetodosSaragoça30 de março de 1746 — BordéusFrança15 de abril de 1828), foi um pintor e gravador espanhol. Conhecido como "Goya, o Turbulento" e considerado às vezes como "o Shakespeare do pincel", suas produções artísticas incluem uma ampla variedade representativa de retratos, paisagens, cenas mitológicas, tragédia, comédia, sátira, farsa, homens, deuses e demônios, feiticeiros, e um pouco do obsceno.


De todos os trabalhos de Goya o que mais aprecio são as gravuras, particularmente esta série: Os Caprichos.
Os Caprichos são uma série de 80 provas em agua-tinta e água-forte, criadas entre 1797 e 1798, e publicadas como álbum em 1799. 
Estas provas foram uma experiência artística, um meio para Goya condenar o que achava mal na sociedade espanhola da altura.
As criticas são feitas em relação à predominância da superstição, a casamentos mal feitos, o declínio da racionalidade, a religião e outros.


Estas gravuras influenciaram e fizeram vários artistas reflectir sobre elas ao longo do tempo, particularmente Delacroix, Manet, Toulouse-Lautrec, Nolde, Klee ou André Malraux. 



Em Escritos sobre arte - Alguns caricaturistas estrangeiros, do poeta e crítico Charles Baudelaire (1857), o autor nos revela o elemento muito raro que Goya introduz no cômico: o fantástico. Ou seja, o olhar que o artista lança sobre as coisas é um tradutor naturalmente fantástico. 





   



Em Os Caprichos observamos uma obra maravilhosa não só pela originalidade das concepções, mas também pela execução. Segundo Baudelaire, o olhar de Goya diante de Os Caprichos, revela o homem um curioso, um amante, não tendo nenhuma noção dos fatos históricos aos quais várias dessas pranchas fazem alusão, um simples espiríto de artista que não saiba quem é Godói, nem rei Carlos, nem a rainha; experimentará, todavia, no fundo do seu cérebro, uma viva comoção por causa da maneira original, da plenitude e da certeza dos meios do artista, e também dessa atmosfera fantástica que envolve todos os seus temas. 





   



Para Charles Baudelaire, há nas obras de Goya profundas individualidades algo que se assemelha a esses sonhos periódicos ou crônicos que assediam regularmente nosso sono. É isso que marca o verdadeiro artista, sempre durável e vivaz, inclusive nessas obras fugazes, por assim dizer, suspensas nos acontecimentos, denominadas caricaturas; é isso, eu dizia, o que distingue os caricaturistas históricos dos caricaturistas artísticas, o cômico fugaz do cômico eterno.

   

Goya é sempre um grande artista, com frequência, assustador. Ele une à graça, à jovialidade, à sátira espanhola do bom tempo de Cervantes, um espírito bem mais moderno ou, pelo menos, que foi bem mais escrutado nos tempos modernos, o amor pelo inapreensível, o sentimento pelo contrastes violentos, pelos espantos  da natureza e pelas fisionomias humanas estranhamente animalizadas pelas circunstâncias. 


  

É algo curioso de observar que surge após o grande movimento satírico e demolidor do século XVIII e com quem Voltaire se mostraria satisfeito pela ideia paenas (pois o pobre grande homem mal se conhecia quanto ao resto), de todas as caricaturas monacais - monges bocejantes, monges glutões, feições ardilosas, hipócritas, finas e perversas como perfis de aves de rapina...






A luz e as trevas se divertem através de todos esses grotescos horrores.



Fontes: Wikipédia e Charles Baudelaire (organização e tradução de Plínio Augusto Coêlho), Escritos sobre arte - 18571, editora Hedra - São Paulo, 2008. 






segunda-feira, 14 de maio de 2012

Mozart - Track 7

            


Wolfgang Amadeus Mozart (em alemão: [vɔlfɡaŋ amadeus mo ː tsaʁt] , Inglês ver fn.), nome de baptismo Johannes Chrysostomus Wolfgangus Theophilus Mozart (27 de janeiro de 1756 - 5 de Dezembro 1791), foi um compositor prolífico e influente do clássico era. Compôs mais de 600 trabalhos, muitos reconhecidos como pináculos de sinfônica , concertante , de câmara , ópera e coral de música. Ele está entre os mais populares de de clássicos compositores.
Mozart mostrou uma habilidade prodigiosa desde sua infância em Salzburgo . Já competente, teclado e violino, ele compôs a partir da idade de cinco e realizada antes da realeza europeia. Aos 17 anos, ele foi contratado como músico da corte em Salzburgo, mas começou a ficar inquieta e viajou em busca de uma melhor posição, sempre compondo abundantemente. Ao visitar Viena em 1781, ele foi demitido de sua posição de Salzburgo. Ele optou por permanecer na capital, onde alcançou a fama, mas a segurança financeira pouco. Durante seus últimos anos em Viena, ele compôs muitas de suas sinfonias mais conhecidas, concertos e óperas, e partes do Requeiem , que foi em grande parte inacabada no momento de sua morte. As circunstâncias de sua morte precoce têm sido muito mitificado. Ele foi socorrido por sua esposa Costanze e dois filhos.
Mozart aprendeu vorazmente com os outros, e desenvolveu um brilho e maturidade do estilo que abrangeu o. Leve e graciosa, juntamente com o escuro e apaixonado Sua influência na posterior ocidental música, arte é profunda. Beethoven escreveu suas primeiras composições próprias, à sombra de Mozart e Joseph Haydn escreveu que "a posteridade não verá um talento mais uma vez em 100 anos". 

Fonte: Wikipédia


Mozart - Lacrimosa




quinta-feira, 10 de maio de 2012

Francisco de Goya e Lucientes - As Jovens, As Velhas - Completo

Excelente documentário sobre as obras de Francisco de Goya, e análises das principais obras deste grande artista plástico de todos os tempos!

   


A partir de dois trabalhos de Francisco de Goya y Lucientes, o documentário traça um paralelo com o contexto social da península Ibérica no século XIX. O trabalho interdisciplinar busca investigar as representações da liberdade por meio da arte ao longo da História.

Francisco José de Goya y Lucientes (Fuendetodos, Saragoça, 30 de março de 1746 — Bordéus, França, 15 de abril de 1828), foi um pintor e gravador espanhol. Conhecido como "Goya, o Turbulento" e considerado às vezes como "o Shakespeare do pincel", suas produções artísticas incluem uma ampla variedade representativa de retratos, paisagens, cenas mitológicas, tragédia, comédia, sátira, farsa, homens, deuses e demônios, feiticeiros, e um pouco do obsceno.


quarta-feira, 9 de maio de 2012

B.B. King - Every Day I Have The Blues Live At The Regal

      

EVERYDAY, I HAVE THE BLUES

B. B. KING


Everyday, everyday i have the blues
Everyday, everyday i have the blues
When you see me worried baby
Because it's you i hate to lose
Oh nobody loves me, nobody seems to care
Yes nobody loves me, nobody seems to care
Speaking of bad luck and trouble
Well you know i had my share
I'm gonna pack my suitcase, move on down the line
Yes i'm gonna pack my suitcase, move on down the line
Where there aint nobody worried
And there aint nobody crying






DEUS E O DIABO NA TERRA DO SOL



"Minha alma deseja a revolução e minhas mãos trabalham para a revolução. Porém o que é revolução ? Uma revolução é a mudança total das leis naturais e sociais. Uma revolução só pode se realizar quando a morte vence a vida, porém ao mesmo tempo a morte é o nada e o nada é contra-revolucionário".




FICHA TÉCNICA

Ficção, longa-metragem, 35mm, preto e branco. Rio de Janeiro, 1964, 3.400 metros,125 minutos; Companhia produtora: Copacabana Filmes; Distribuição: Copacabana Filmes; Lançamento: 10 de julho de 1964, Rio de Janeiro (Caruso, Bruni-Flamengo e Ópera); Produtor: Luiz Augusto Mendes; Produtores associados: Jarbas Barbosa, Glauber Rocha; Diretor de produção: Agnaldo Azevedo; Diretor:Glauber Rocha; Assistentes de direção: Paulo Gil Soares, Walter Lima.Jr.;Argumentista: Glauber Rocha; Roteiristas: Glauber Rocha, Walter Lima Jr.; Diálogos: Glauber Rocha, Paulo Gil Soares; Direção de fotografia e câmera: Waldemar Lima; Cenógrafo e Figurinista: Paulo Gil Soares; Letreiros: Lygia Pape;Gravuras: Calasans Neto; Cartaz:Rogério Duarte; Música: Villa-Lobos; Canções: Sérgio Ricardo (melodia), Glauber Rocha (letra); Violão e voz: Sérgio Ricardo;Continuidade: Walter Lima Jr.; Locações: Monte Santo, Feira de Santana, Salvador, Canché (Cocorobó), Canudos (BA); Prêmios: Prêmio da Crítica Mexicana - Festival Internacional de Acapulco, México, 1964; Grande Prêmio Festival de Cinema Livre, Itália, 1964; Náiade de Ouro - Festival Internacional de Porreta Terme, Itália, 1964; Troféu Saci/ Melhor Ator Coadjuvante: Maurício do Valle, 1965; Grande Prêmio Latino Americano - I Festival Internacional de Mar del Plata, Argentina, 1966.Elenco: Geraldo Del Rey - Manuel; Yoná Magalhães - Rosa; Maurício do Valle - Antonio das Mortes; Othon Bastos - Corisco, Lídio Silva - Sebastião; Sônia dos Humildes - Dadá; Marrom - Cego Julio; Antônio Pinto - Coronel; João Gama - Padre; Milton Roda - Coronel Moraes; Roque; Moradores de Monte Santo.

SINOPSE
"Eu parti do texto poético. A origem de "Deus e o Diabo..." é uma língua metafórica, a literatura de cordel. No Nordeste, os cegos, nos circos, nas feiras, nos teatros populares, começam uma história cantando: eu vou lhes contar uma história que é de verdade e de imaginação, ou então que é imaginação verdadeira. Toda minha formação foi feita nesse clima. A idéia do filme me veio espontaneamente."
Glauber Rocha

COMENTÁRIO

"Que conta Deus e o Diabo na Terra do Sol ?

O argumento de Deus e o Diabo na Terra do Sol é uma síntese de fatos e personagens históricos concretos (o cangaço e o mandonismo local dos coronéis no Nordeste, o beatismo ou misticismo de base milenarista, a literatura de Cordel, Lampião e Corisco, Euclides da Cunha e Guimarães Rosa, Antônio Conselheiro e Antônio Pernambucano (jagunço ou assassino de encomenda de Vitória da Conquista). O vaqueiro Manuel se revolta contra a exploração de que é vítima por parte do coronel Morais e mata-o durante uma briga. Foge com a esposa Rosa da perseguição dos jagunços e acaba se integrando aos seguidores do beato Sebastião, no lugar sagrado de Monte Santo, que promete a prosperidade e o fim dos sofrimentos através do retorno a um catolicismo místico e ritual. Ao presenciar o sacrifício de uma criança, Rosa mata o beato. Ao mesmo tempo, o matador de aluguel Antônio das Mortes, a serviço dos coronéis latifundiários e da Igreja Católica, extermina os seguidores do beato. Em nova fuga, Manoel e Rosa se juntam a Corisco, o diabo loiro, companheiro de Lampião que sobreviveu ao massacre do bando. Antônio das Mortes persegue de forma implacável e termina por matar e degolar Corisco, seguindo-se nova fuga de Manoel e Rosa, desta vez em direção ao mar.



No início, conta a estória, tão freqüente na literatura verista do século XIX, do camponês que, num momento de desespero, mata o patrão escravista. Mas, desde o momento em que Manuel se embrenha na caatinga e se junta ao bando dos fanáticos seguidores do Santo Sebastião -- um profeta negro que afirma que um dia o mar vai virar sertão e o sertão vai virar mar e que o sol choverá ouro e que, portanto, para provocar esse milagre, é preciso matar todos os que fazem o mal, isto é, principalmente os padres e as prostitutas --, desse momento em diante, o filme conta algo de muito moderno: as alucinações, as visões, as práticas e os modos de conduta aberrantes que a fome, a miséria e a ignorância podem inspirar num povo desesperado.
Em São Sebastião e seus seguidores, fome, ignorância e miséria fazem arder uma loucura que os impele até aos sacrifícios humanos; no cangaceiro Corisco, a cujo bando Manuel se junta depois que o Santo Sebastião e seu grupo são destruídos, fome, ignorância e miséria fomentam uma ferocidade insaciável, sistemática, demoníaca.
Assim, o Santo Sebastião e Corisco representam Deus e o diabo, ambos deformados e transtornados pela solidão do sertão. De maneira característica, a solução do problema social representado por figuras como o Santo Sebastião e Corisco é confiada à carabina infalível deAntônio das Mortes, matador profissional, figura sinistra, melancólica e lógica de assassino visionário, o qual imagina que, uma vez eliminados o diabo (Corisco) e Deus (o Santo Sebastião), haverá então a guerra de libertação, ou melhor, a revolução, que redimirá o sertão. É assim que Antônio das Mortes fulmina o profeta e o bandido. Manuel, símbolo do povo brasileiro, escapa, testemunha viva da verdade das teses do filme."
Alberto Moravia, trecho de artigo no semanário L’Espresso, 16/08/64, Roma.

Fonte: www.tempoglauber.com.br